Ana Carolina Cáceres de 25 anos |
“Quando li a reportagem sobre a ação que pede a liberação do aborto em caso de microcefalia no Supremo Tribunal Federal (STF), levei para o lado pessoal. Me senti ofendida. Me senti atacada.
No dia em que nasci, o médico falou que eu não teria nenhuma chance de sobreviver. Tenho microcefalia, meu crânio é menor que a média. O doutor falou: ‘ela não vai andar, não vai falar e, com o tempo, entrará em um estado vegetativo até morrer’.
Ana Carolina Cáceres (MS).
Zika Vírus e o
Aborto
Os que defendem a
legalização do aborto encontraram na associação do aumento da microcefalia com
o surto de zika vírus uma oportunidade para retomar a discussão da liberação do
aborto no Brasil.
Recentemente foi
noticiado que grupo liderado pela Débora Diniz, do instituto de bioética Anis,
prepara uma ação no STF para a liberação do aborto em casos de microcefalia. É
o mesmo grupo que propôs a ação para interrupção da gravidez de anencéfalos,
acatada pelo STF em 2012.
A bióloga e
feminista Ilana Löwy, numa entrevista para a Revista ÉPOCA, vê no surto de zika
vírus uma oportunidade para se debater o direito de decisão da mulher de ter ou
não o bebê, como aconteceu com a epidemia de rubéola no Reino Unido.
Interessante é que a Rubéola hoje em dia é uma doença totalmente controlável e
passível de prevenção através da vacinação, deixando de ser um risco epidêmico,
usado como justificativa para a liberação do aborto na Europa.
Os argumentos
utilizados se baseiam na liberdade da mulher poder escolher o que é melhor para
si, esquecendo que existe uma vida a qual se está negando o primeiro e mais
fundamental dos direitos humanos, o direito à vida.
Cabe ressaltar que
os fundamentos utilizados para liberar o aborto dos fetos anencéfalos não se
aplicam nesses casos.
O diagnóstico da
microcefalia é tardio, em torno da 28ª semana, diferentemente da anencefalia,
que é feito a partir da 12ª semana de gestação.
As lesões da
microcefalia geralmente aparecem na ultrassonografia depois da 24ª e não são
incompatíveis com vida, como nos casos de anencefalia.
Além disso, o
diagnóstico ecográfico de lesão neurológica não é 100% seguro, já que depende
da análise de um profissional passível de equívocos. Existem inúmeros relatos
de erros em fetos com diagnóstico de mal-formações neurológicas e que nasceram
perfeitamente normais.
No entanto, os que
argumentam em favor do aborto querem transformar o diagnóstico de microcefalia
em atestado de morte para todas as crianças das mães que contraíram o zika
vírus e que optarem pela interrupção da gravidez, mesmo com possibilidades de
nascerem normais ou com poucas sequelas neurológicas.
Com o avanço da
medicina fetal e da genética médica, hoje é possível a detecção, ainda no
útero, de várias anomalias fetais. Diversas técnicas como ultrassom morfológico,
ultrassom de terceira dimensão, a biópsia de vilos coriais, a amniocentese, a
cordocentese, o desenvolvimento da técnica citogenética molecular permitem o
diagnóstico intrauterino de várias doenças. O diagnóstico permite iniciar o
tratamento antes do nascimento, como cirurgias intrauterinas para correções de
más-formações, assim como a preparação psicológica dos pais para o
enfrentamento das graves anomalias.
Querer selecionar
apenas as crianças saudáveis com direito à vida é retomar a prática da eugenia
feita na Grécia antiga e pelo nazismo, abrindo um precedente para a liberação
do aborto em outros casos de microcefalia como as causadas por hipóxia
neonatal, desnutrição grave na gestação, fenilcetonúria materna, rubéola
congênita na gravidez, toxoplasmose congênita na gravidez, infecção congênita
por citomegalovírus ou em doenças genéticas como Síndrome de Down, Síndrome de
Cornelia de Lange, Síndrome Cri du Chat, Síndrome de Rubinstein – Taybi,
Síndrome de Seckel, Síndrome de Smith-Lemli–Opitz e Síndrome de Edwards.
Nesses casos
pessoas como Ana Carolina Dias Cáceres, moradora de Campo Grande (MS), hoje com
24 anos e formada em jornalismo, e tantas
outras crianças em situações
parecidas, não teriam direito à vida.
Ana Carolina Cáceres |
Ao saber da
iniciativa de alguns em defender o aborto de fetos com microcefalia, Ana
Cáceres veio a público dar seu depoimento a BBC do Brasil em defesa dos
portadores de microcefalia.
Nos casos
microcefalia não se pode falar na opção de abortamento, pois não se trata de
patologia letal que inviabilize a vida extrauterina. Embora as limitações que
possam surgir, a expectativa de vida das crianças com microcefalia não são
diferentes das outras crianças, exigindo, no entanto, estimulação e cuidados
especiais para melhorar a sua qualidade de vida.
A discussão do
aborto em casos de microcefalia retrata bem o momento pós-moderno em que
vivemos, o que Bauman, um dos maiores pensadores da atualidade, chama de
modernidade líquida. Na modernidade líquida os
indivíduos não possuem mais
padrões de referência, nem códigos sociais e culturais que lhes possibilitem,
ao mesmo tempo, construir sua vida e se inserir dentro das condições de classe
e cidadão.
Zygmunt Bauman sociólogo polonês. Bauman |
A modernidade
líquida trouxe descentramento do homem, do sujeito, produzindo identidades
híbridas, locais e globais, efêmeras sobre tudo. É a cultura do efêmero, da
destruição criativa, “tudo que é sólido desmancha no ar” na imagem trazida por
Berman.
Para a maioria dos
autores, a pós-modernidade é marcada como a época das incertezas, das
fragmentações, do narcisismo, da troca de valores, do vazio, do niilismo, da
deserção, do imediatismo, da efemeridade, do hedonismo, da substituição da
ética pela estética, da apatia, do consumo de sensações e do fim dos grandes
discursos.
A educação recebida
dos pais e das escolas, os valores morais
que orientam as boas relações sociais, o fortalecimento da família e a busca do
bem comum está perdendo espaço para novas formas de comportamento regidas pelas
leis do mercado, do consumo e do espetáculo.
Existe uma crise de
valores com perda de referenciais importantes em detrimento de uma vida
superficial e de um discurso liberal.
Na sociedade
pós-moderna predomina o ter acima do ser, o prazer pelo prazer, o prazer acima
de tudo, à permissividade que justifica que tudo é bom desde que me sinta bem,
o relativismo no qual não há nada absoluto, nada totalmente bom ou mau e as
verdades são oscilantes, o consumismo, se vive para consumir, e o niilismo
caracterizado pela subjetividade, a paixão pelo nada, numa indiferença assustadora.
Renata Araújo
descreve muito bem o sujeito pós-moderno:
“A pós-modernidade nos apresenta um
sujeito imediatista, fragmentado, narcisista, desiludido, ansioso, hedonista,
deprimido, embora também informatizado, buscando independência, autonomia e
defesa de seus direitos. Mas, a supervalorização e autonomia geram um
individualismo, um egocentrismo, uma ênfase na subjetividade, sendo o outro
apenas para a consecução de seus objetivos pessoais.” (ARAÚJO, p. 1 e 2)
Vive-se numa época
de grande competitividade e de pouca solidariedade. Em nome dessa nova
ideologia, os indivíduos se permitem agir passando por cima de valores
fundamentais.
A
coisificação da vida e o predomínio dos interesses pessoais em detrimento do
coletivo são bem característicos dessa fase em que vivemos.
Entretanto,
aprendemos com a genética que a diversidade é a nossa maior riqueza coletiva.
E o feto anômalo, mesmo o portador de grave
E o feto anômalo, mesmo o portador de grave
deficiência, como é o caso da
microcefalia, faz parte dessa diversidade. Deve ser, portanto, preservado e
respeitado.
Necessário
se faz proteger também a gestante, dando a ela apoio em sua gravidez e
proporcionando tratamento ao seu futuro filho.
Reconhecemos
que a mulher que gera um feto deficiente precisa de ajuda psicológica por longo
tempo; constatamos, porém, que, na prática, esse direito não lhe é assegurado.
O aborto provocado
é um procedimento traumático com repercussões gravíssimas para a saúde mental
da mulher e que geralmente aparecem tardiamente.
O aborto produz um
luto incluso devido à negação da ocorrência de uma morte real, mas esse aspecto
é totalmente desconsiderado.
As mulheres sofrem
uma perda e suas necessidades emocionais são relegadas ou escondidas. Elas não
conseguem vivenciar o seu luto e lidar com a culpa. Esse processo vai gerar
profundas marcas e favorecer o surgimento da Síndrome pós-aborto (PAS).
Psiquiatras e
psicólogos especializados em atender mulheres que abortaram alertam para o
aumento dos transtornos emocionais causados pelo aborto provocado. Eles afirmam
que os efeitos psicológicos do aborto são extremamente variados e não são
determinados pela educação recebida ou pelo credo religioso.
Esclarecem que a
reação psicológica ao aborto espontâneo e ao aborto involuntário é diferente,
está relacionada com as características de cada um desses dois eventos.
O aborto espontâneo
é um evento imprevisto e involuntário, enquanto o aborto provocado
interrompendo o desenvolvimento do embrião ou do feto e extraindo-o do útero
materno contempla a responsabilidade consciente da mãe. As mulheres que se
submeteram ao aborto afirmam que a culpa não é gerada de fora para dentro,
infundida nelas por outras pessoas ou pela religião, ao contrário, ela surge e
cresce em seu mundo íntimo a partir do ato abortivo.
Os problemas
emocionais gerados pelo aborto são tão graves, que em muitos países onde ele é
legalizado, foram criadas, pelas próprias mulheres vitimadas pelo aborto,
associações como a Women Exploited by Abortion (Mulheres Exploradas pelo
Aborto) nos EUA, e a Asociación de Víctimas del Aborto (Associação de Vítimas
do Aborto) na Espanha, que orientam e alertam sobre as consequências
prejudiciais do aborto.
O aborto não é
definitivamente uma "solução fácil" como afirmam muitos, mas um grave
problema, um ato agressivo que terá repercussões contínuas na vida da mulher.
As consequências
danosas provocadas pelo aborto à saúde mental nos países onde ele foi
legalizado é tão grave, como a depressão profunda, que o Royal College of
Psychiatrists (associação dos psiquiatras britânicos e irlandeses), alertaram
que a mulher deve ser comunicada para os graves riscos emocionas que se submete
caso opte pela interrupção da gravidez.
Portanto,
aborto nunca será uma solução, sempre um lado ou ambos serão prejudicados. Não
é dando a mulher autonomia para matar seu filho dentro de seu ventre que
resolveremos os problemas sociais. Isto não passa de demagogia. É necessário
investir na educação das massas para prevenção da gravidez indesejada, mas
jamais matar uma criança inocente. Os fins não podem justificar os meios.
A
sociedade que apela para o aborto declara-se falida em suas bases educacionais,
porque dá guarida à violência no que ela tem de pior, que é a pena de morte
para inocentes. Compromete, portanto, o seu projeto mais sagrado que é o da
construção da paz.
A Associação Médico-Espírita do Brasil reitera seu posicionamento contra qualquer
forma de violência a uma nova vida que não põe em risco a vida materna e que
surge aguardando o auxílio de braços fortes e sensíveis que lhe ampare em sua
fragilidade.
Concitamos
a todos os colegas das AMEs para continuarmos firmes em defesa da vida e da
paz.
AME-Brasil
REFERÊNCIAS
1) ARAÚJO, Renata Castro Branco. O
Sofrimento Psíquico na Pós-Modernidade: Uma Discussão Acerca dos Sintomas
Atuais na Clínica Psicológica. Trabalho de Conclusão do Curso de Pós-Graduação
em Psicologia Clínica. Disponível em: http://www.psicologia.pt/artigos/textos/TL0311.pdf Acessado
em 09/02/2016.
2) BAUMAN, Zygmunt. Ética
Pós-moderna. São Paulo: Paulus Ed., 1997.
3) BAUMAN, Zygmunt. Modernidade
líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
4) BAUMAN, Zygmunt. Tempos Líquidos.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007.
5) BAUMAN, Zygmunt. Cegueira Moral.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2014
6) BERMAN, Marshall. Tudo que é
Sólido Desmancha no Ar. São Paulo: Schwarce ed., 1986.
7) CÁCERES, Ana Carolina Dias 'Existo
porque minha mãe não optou pelo aborto', diz jornalista com microcefalia.
Disponível em:
8) LÖWI, Ilana. A rubéola levou à
legalização do aborto no Reino Unido. O zika fará o mesmo no Brasil? Disponível
em: http://epoca.globo.com/vida/noticia/2016/02/rubeola-levou-legalizacao-do-aborto-no-reino-unido-o-zika-fara-o-mesmo-no-brasil.html Acessado
em 09/02/2016.
9) RAZZO, Francisco. Um novo nome
para uma velha fantasia. Disponível em:http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/um-novo-nome-para-uma-velha-fantasia-86ax9r1xg929hkv6wv2iff9ioAcessado
em 09/02\/2016.
FONTE: AME BRASIL
VEJA O DEPOIMENTO DE ANA CAROLINA CÁCERES SOBRE A MICROCEFALIA - LOGO DEPOIS PALESTRA DO DR. DÉCIO IANDOLI JR.
Publicado em 27 de fev de 2016
Plenarinho da Camara Municipal de Campo Grande
Dr. Décio Iandoli Jr.
23 de fevereiro 2016
Campo Grande - MS
vanderlipantolfipsicanalista.blogspot.com.br CLIQUE AQUI - CONTATOS E AGENDAMENTOS |
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